Você conhece o Turismo de Orfanato?
Recentemente alguns atores das redes de proteção dos direitos de crianças e adolescentes têm nos perguntado o que é Turismo de Orfanato. O termo é mencionado algumas vezes no resumo executivo do estudo global sobre a exploração sexual de crianças e adolescentes, documento produzido por ECPAT Internacional e traduzido pela ECPAT Brasil. Entretanto, o documento não trás conceitos, por se tratar de uma síntese do estudo.
O Turismo de Orfanato é uma modalidade do Volunturismo, uma modalidade de viagem onde o viajante se propõe a realizar trabalho voluntário em alguma instituição, visando ter uma experiência filantrópica ao mesmo tempo em que conhece outra cultura e visita pontos turísticos. Apesar de não ser novidade tal modalidade têm ganhado mais força nos últimos anos, que por vezes se restringia no deslocamento de turistas de países mais ricos e desenvolvidos para países mais pobres.
Além disto, o volunturismo têm se tornado mais profissionalizado. De acordo com Martín Caparrós em artigo ao El País:
“Volunturismo não é trabalhar um ano em um hospital em Bangladesh; é participar de uma viagem organizada para passar duas ou três semanas cuidando das crianças de um orfanato no Nepal ou cavando poços no Haiti. Até recentemente, para ir ao Terceiro Mundo como voluntário, era preciso contatar uma ONG que examinava os candidatos e lhes exigia permanência. Agora, existem agências especializadas que vendem a experiência — customizada ao gosto do cliente — em três ou quatro cliques”.
O Turismo de Orfanato é uma modalidade específica que envolve viagens para tais instituições, onde o viajante possui a oportunidade de realizar trabalhos voluntários com crianças e adolescentes órfãos. Entretanto estes projetos de voluntariado curto e rápido podem trazer mais malefícios do que benefícios. Ian Birrel escreve ao The Guardian que:
“Turistas ricos impedem que os trabalhadores locais obtenham empregos, especialmente quando pagam para se voluntariar; instituições duramente perdem tempo procurando por estes turistas e por recursos para aprimorar suas instalações; e crianças abusadas ou abandonadas formam apegos emocionais aos visitantes, o que apenas aumentam seus traumas quando eles desaparecem ao retornar para suas casas*”.
Mas para além das questões que envolvem a economia local e o desenvolvimento afetivo das crianças, cabe ressaltar que esta modalidade de turismo abre oportunidades para situações de violência sexual. Crianças órfãs se encontram diante de inúmeras vulnerabilidades e em uma situação peculiar de fragilidade diante das relações de poder com estes adultos.
Um país que tem sido alvo de reflexões é o Camboja. Em reportagem de Christopher Knaus, também para o The Guardian:
“Mas, em lugares como o Camboja, os orfanatos estão agora substituindo as formas mais tradicionais de cuidado parental e de cuidados comunitários em relação a crianças órfãs. Para sustentar os negócios, as crianças são “recrutadas” de famílias pobres com promessas de educação e uma vida melhor. Algumas são traficadas”.
O artigo menciona a pesquisa realizada em orfanatos e que constata que:
“Nós vemos orfanatos que se tornaram atrações turísticas e que, em muitos casos, não há verificação rigorosa de antecedentes daqueles que receberão acesso à instalação. Isso coloca as crianças em risco de exploração e abuso sexual”.
No Brasil este termo não é comum e não encontramos registros ainda de que ele fenômeno esteja ocorrendo de forma sistemática. É importante termos acesso a informações para conseguirmos refletir e pensar em nossos passos.
*: Trechos originalmente em inglês
Muito bom estar ciente de novos conceitos. É muito triste saber que a mercantilização tem ultrapassado os limites mais absurdos. Ou mudamos essa lógica desumana ou não sei até quando conseguiremos suportar esse sistema. Esperança e fé para nós!